"O III Festival de Teatro do Faial, organizado este ano pelo Teatro de Giz, terminou no passado dia 18 de Abril. E terminou com um brilho peculiar, só possível nos meandros destas andanças que cruzam pessoas que querem e vivem uma arte que se traduz num momento compacto, mágico, nunca repetido de cada vez que acontece. A companhia de teatro O BANDO trouxe até nós “Afonso Henriques”, uma peça infanto-juvenil encenada e levada à cena por João Brites em 1982, que conta a história do nosso país, desde o nascimento do pequeno Afonso até à sua morte. É um espectáculo que, de acordo com o que nos foi narrado pelos que cá estiveram, serve de ninho aos que integram pela primeira vez a companhia de Palmela - “Serve para os ambientar, para criarem rodagem, para os introduzir à linguagem própria d’O BANDO”. É um espectáculo, mas esteve para não acontecer. Porque os imprevistos existem (e às vezes ainda bem que assim é), uma das actrizes do elenco ficou retida no Porto não havendo hipótese de se deslocar até à nossa ilha para realizar o espectáculo. A ideia de cancelar a actuação não vingou e os 4 actores que aqui chegaram criaram disposição e dispositivos para enfrentar o desafio: é um texto que conhecemos bem, dividimos papeis, assumimos a cena e pelo meio da conversa, a um de nós escaparam-se as palavras - se precisarem de uma ajuda… Com a resposta, suámos por dentro. E depois, sorrimos.
Organizámos um almoço, aberto ao público interessado, para partilhar experiências (e febras assadas nos grelhadores do parque de Almoxarife) com uma das mais reconhecidas companhias de teatro profissional do país. Aprendemos como trabalham, qual a sua linha de acção, conversámos sobre o que já fizeram e o que pensam fazer e aflorámos a hipótese de realizarmos algo em conjunto no futuro. No final, quando chegou a hora de rumarem ao Teatro Faialense
para os ensaios finais do que viria a ser um espectáculo especial,
foi com imenso orgulho e prazer que observámos a Márcia Dutra do Teatro de Giz, juntar-se a eles: era a escolhida para nas 6 horas seguintes, conseguir integrar-se no elenco da peça.
Entre as 21h30 e as 22h30 desse dia o espectáculo aconteceu.
Quem lá estava, sentiu certamente o ritmo, as palavras, os gestos, a dinâmica de cena. Quem lá estava, viu a Márcia Dutra fundir-se sem mácula num colectivo vigoroso que sabe degustar o Teatro e ouviu os actores contarem uma história única que ali surgiu e ali ficou. Quem lá estava sorriu, reflectiu e aplaudiu, antes de se retirar de novo para a sua própria vida (com mais alguma coisa dentro de si).
O Festival de Teatro do Faial, organizado pelo Teatro de Giz, terminou com um brilho peculiar, mas não saciou por completo aquela que é a fome de quem quer fazer mais. O intuito do nosso
grupo, desde a sua génese, é contribuir fortemente para uma dinâmica cultural verdadeira, na ilha do Faial e, num âmbito mais alargado, dos Açores. Para que aconteça, é necessário fazer mas também partilhar e para partilhar é necessário que as pessoas que constituem o nosso tecido social se transformem em público, se interessem, abracem de forma mais intensa o projecto e as propostas por ele apresentadas. Só assim o Teatro faz sentido. Não quero dizer com isto que não houve aderência à iniciativa, facto incontestável na presença das cerca de 700 pessoas que se deslocaram ao Teatro Faialense, durante este festival. Repito-me, o que eu quero dizer, é que queremos mais, porque mais é indispensável a uma sociedade desperta, crítica, sensível, capaz de usufruir do leque de alternativas que lhe é disponibilizado. Neste contexto, esperamos organizar um outro Festival de Teatro onde nos possamos esforçar para apresentar um programa mais completo, mais coerente, mais amplo, sustentado numa divulgação ainda mais forte e eficaz. Mas esperamos também uma maior aderência por parte dos que querem
ver e, especialmente, dos que querem conhecer o Teatro por dentro. As oficinas que organizámos e que organizamos procuram cativar as pessoas para este mundo paralelo que tão bem reflecte a vida, por vezes, em minutos. Porque esta é uma componente essencial, lanço o desafio àqueles que nunca fizeram teatro ou que o fazem no seio de outro grupo amador das nossas ilhas: na próxima oficina ou workshop aberto ao público organizado pelo Teatro de Giz (e porque não no âmbito do próximo Festival de Teatro do Faial) apareçam para experimentar e desfrutar.
Vão ver que não dói nada.
Dói é não fazer, ou ver que não se faz…"
Teatro de Giz
in FAZENDO - Agenda Cultural Faialense, nº16, Abril 2009